"Vigiai, pois, porque não sabeis a que hora há de vir o vosso Senhor. Mas considerai isto: se o pai de família soubesse a que vigília da noite havia de vir o ladrão, vigiaria e não deixaria que fosse arrombada a sua casa." JESUS (Mt 24, v.42-43)
Pensar a respeito da morte, ou melhor dizendo, desencarne, é pensar na vida. É melhorar a vida, o modo de ver a vida, o modo de viver. É aferir valores e viver de acordo com eles. Como? Os orientais explicam.
Os tibetanos meditam sobre a morte
(B. Alan Wallace, in “Budismo com atitude – o treinamento tibetano da mente em 7 etapas”, pág.30-33).
A meditação sobre a natureza da rude e sutil impermanência é também fortemente enfatizada na tradição budista. Indo mais fundo na natureza da impermanência, os tibetanos meditam sobre a morte.
Existe uma objeção razoável à meditação sobre a morte. Como estamos vivos agora, por que não prestar atenção ao fato de estarmos vivos e deixar a meditação sobre a morte para quando estivermos morrendo? Afinal, quando chegar o seu momento de morrer, você não vai querer ficar nostálgico sobre a vida.
A razão da meditação sobre a morte não é estragar a felicidade, mas encontrá-Ia. Os seres humanos tendem a fazer várias maldades, e as religiões do mundo assumiram a responsabilidade de reformar os humanos para melhor (sem misturar os resultados!). Como a maior parte do nosso comportamento habitual não é boa, temos de ser persuadidos a melhorá-Ia. O medo é um método muito eficaz de persuasão. As autoridades religiosas têm, tradicionalmente, tentado persuadir as pessoas a serem boas não somente pelo medo da morte, mas pelo medo do desconhecido e pelo medo do enorme desconhecido, a vida após a morte. As doutrinas religiosas sobre a morte são propositalmente assustadoras.
O Buda afirmava que o propósito do seu ensinamento sobre a morte não era assustar as pessoas para elas serem boas, mas prepará-Ias para a morte nesta vida. Os ensinamentos não se destinavam especificamente a assustar, mas se já existe o medo da morte, melhor conhecer do que temer, comprometer-se com ela e prosseguir de modo que, quando ela realmente chegar, não haja medo.
Ao estudar sobre a preciosidade e a raridade de nossa vida, reconhecemos que a vida está passando exatamente agora. Nunca mais teremos este dia. Esta enorme oportunidade passa rapidamente e, então, tudo pára completamente. Quando o seu corpo acaba, sua preciosa vida humana acaba. Considerar a preciosidade e a impermanência da vida é um incentivo. Se existe algo digno de realizar aqui, realize-o.
(...) Considere novamente as oito preocupações mundanas - buscar bens materiais e evitar sua perda, buscar o prazer e evitar o desconforto, buscar o elogio e evitar a culpa, manter a boa reputação e evitar a má reputação. A mente se torna descontente. Os budistas têm dificuldade de lidar com o descontentamento. Eles ficam irritados por estarem irritados, e isto foge ao controle. É muito útil manter uma atitude relaxada e ser apaixonado por uma coisa - a prática espiritual.
A meditação sobre a morte o ajuda a se livrar das pequenas preocupações que corroem seu potencial ilimitado. A meditação sobre a morte é um chamado para o despertar. O seu propósito não é assustá-Io com o que o bicho-papão fará a você depois da sua morte, mas fazê-lo ver as oportunidades que você tem agora, compreender que elas existem somente por um tempo limitado e que você deve aproveitá-Ias. Além disso, certifique-se de que aquilo que você está praticando é realmente o dharma e não uma das preocupações mundanas que, diante da morte, perdem todo o seu fascínio.
A meditação budista sobre a morte é composta de três partes:
A primeira é a meditação sobre a inevitabilidade da nossa própria morte. Podemos dizer que já sabemos disso. É fácil. Mas estamos atentos a isso? Se não estivermos, não a estaremos considerando em nossas decisões. Se não estivermos levando a sério a inevitabilidade da morte, então não acreditamos realmente nela.
Embora possamos viver de modo cuidadoso, haverá um tempo em que a morte chegará. Ela se apresentará. E acontecerá. Aconteceu com Buda e com Jesus, e acontece com presidentes e reis. Rico ou pobre, mais cedo ou mais tarde você morrerá, e sua morte será somente sua. A inevitabilidade é a primeira das três partes da meditação sobre a morte. (...)
A segunda parte da meditação sobre a morte é que ela pode chegar a qualquer momento. Ela é imprevisíveI. Não marca um encontro. Os tibetanos possuem uma lista dos momentos em que a morte chega - no ventre, no nascimento, nos primeiros anos, na infância, na juventude, na adolescência, no adulto jovem, na meia-idade e na velhice -, qualquer momento é perfeito para morrer. Você pode morrer com boa ou má saúde, rico ou pobre, culto ou não. Um ponto importante para os ocidentais é que você pode morrer antes ou depois de ter concluído seus projetos. A morte pode acontecer a qualquer momento. Qual a base para a confiança de que a morte poderá chegar, mas não para mim? Trata-se de um pensamento de desejo, nada mais. A segunda parte da meditação sobre a impermanência é a compreensão da imprevisibilidade da morte.
A terceira parte da meditação sobre a morte é prestar atenção ao que é de valor diante da morte. A morte faz parte da vida, não é uma antítese da vida. Com a conscientização da morte, qual é o valor da vida? Esta questão é a base sobre a qual o dharma (Caminho para Realidade Superior) é definido. Com uma conscientização da sua própria mortalidade, o dharma é o que existe de maior valor. O que tem valor - uma mente clara, um coração compassivo, um sentido de sabedoria, equanimidade, paciência e clemência, servir aos outros? A meditação sobre a morte é a maneira mais direta de conferir e aprimorar os valores.
Ao lermos o texto, vimos como é prejudicial o medo da morte que, instintivamente, trazemos conosco. O pavor que muitos temos de "perder" seus entes queridos ou deixá-los na terra nos é prejudicial, porque a vontade que temos que nós e os outros vivam é puro desejo, não é realidade. Não se preparar para a realidade é entrar em choque com ela quando ela vier.
Se realmente sentíssemos mortais, seguiríamos o conselho do Cristo: deixaríamos a casa em ordem para quando chegasse o senhor. Faríamos as pazes com aquelas pessoas que estamos brigados; abraçaríamos nossos familiares e amigos e lhes diríamos aquilo que gostaríamos que ouvissem antes que se fossem; admitindo que a morte pode ser iminente, faríamos as coisas que realmente são importantes para nós; admitindo a realidade espiritual, procederíamos sempre de acordo com as soberanas Leis da Vida contidas no Livro dos Espíritos, a fim de não criarmos carmas negativos que nos prejudicassem nem a outrem.
Quer um exercício simples para descobrir o que realmente você busca? Imagine-se andando pela avenida principal. Há uma casa com uma movimentação à frente. A porta está aberta, e tem um corredor. Entre no corredor. Note que ao fundo você vê pessoas e flores. Entre na sala. No centro da sala há um caixão. É um velório. As pessoas que estão na sala são suas conhecidas. Aproxime-se do caixão, ao ver o corpo, voce descobre que... é o seu próprio funeral. Nesse momento vão fazer a despedida antes do enterro. Quatro pessoas falarão, ao invés do padre. A primeira será o representante dos seus familiares. Procure escutar o que fala de você como foi com a família, o que dizem que lembram de você. O segundo a falar é o representante dos seus amigos. Escute-o. O terceiro é o representante de uma comunidade a qual você pertence, como o centro espírita ou um clube. E o quarto a fazer o discurso de despedida é um representante da comunidade. O que você gostaria que eles falassem nesse momento? Das pessoas presentes, quantas você tinhas questões mal-resolvidas que você não tentou encerrar? Existe alguém que você gostaria de ter perdido perdão? Que qualidades voce gostaria ouvir que tinha em vida? Escute... Esses são seus valores e anseios mais verdadeiros.
Espero que o tema tenha servido para a melhoria íntima de vocês. Aproveitem as férias! Um abraço.
Nenhum comentário:
Postar um comentário